Sergio Senoux

Project

SSSS: O reencontro de Vince Clarke e Martin Lee Gore


Seria apenas um projeto minimalista, sem compromisso, sem pressão, sem cronograma... somente para trocarem boas ideias e se divertirem. Mas SSSS marcou o primeiro reencontro de duas lendas do synthpop - e membros da formação original do Depeche Mode - 30 anos após o hit Just Can't Get Enough (1981).

O VCMG (acrônimo das iniciais dos músicos) uniu Vince Clarke (Erasure, Yazoo, Depeche Mode) e Martin Lee Gore (Depeche Mode). Inspirado no Techno, o álbum de 10 faixas foi lançado pela Mute Records em 12 de março de 2012. Antes, dois singles haviam sido editados - os EP's Spock (dezembro de 2011) e Single Blip (fevereiro de 2012). Posteriormente foi publicado um terceiro EP single, o Aftermaths (agosto de 2012).

Influência

Em 2011, Vince Clarke trabalhava no remix para Elektrostatik, do produtor canadense Richie Hawtin (a.k.a. Plastikman). Vince afirma na entrevista que lhe foi pedido um remix e que ele não sabia nada sobre Techno. Buscou referências sonoras para essa produção e viu seu interesse pelo gênero da dance music crescer. Daí, começou produzir algumas faixas autorais.

Vince porém percebeu que precisava de uma parceria. Sem pensar muito, tratou de convidar Martin Gore para o projeto. Uma simples mensagem e um breve sim como resposta deram partida a um vai e vem de e-mails com insights e arquivos musicais. Clarke e Gore trabalhavam em grande sintonia, mesmo sozinhos em seus respectivos estúdios, durante toda a produção.

Tenho ouvido muita música dance minimal e fiquei muito intrigado com todos os sons... percebi que precisava de um parceiro... então me ocorreu falar com Martin.Vince Clarke

Do nada, recebi um e-mail do Vince apenas dizendo:‘ Estou interessado em fazer um álbum techno. Você está interessado em colaborar? "Isso foi há cerca de um ano. Ele disse: ‘Sem pressão, sem prazos’, então eu disse ‘OK’!Martin Lee Gore, 2012

Aclamado por críticos da Europa, SSSS foi totalmente produzido pelo duo Clarke-Gore e mixado por Timothy 'Q' Wiles (Überzone), artista eletrônico da Califórnia. O trabalho de Wiles foi uma indição do produtor Daniel Miller (o influente e visionário fundador da Mute Records).

Gore cita no vídeo que a mixagem de 'Q' seria apenas para o primeiro single, e que eles gostaram do resultado. Pediram mais algumas faixas, e com mais mixagens aprovadas, optaram por deixar todo o álbum a cargo do produtor norte-americano.

O álbum foi gravado e projetado por Sie Medway Smith e Vince Clarke, e masterizado por Stefan Betke (Pole) - trabalho que também recebeu muitos elogios por valorizar a profundidade de todos os elementos das tracks.

Sonoridade

SSSS é fruto da experimentação que levou Vince e Martin a uma viagem de volta a sonoridade de seus trabalhos anteriores. É algo como voltar no tempo e revisitar tímbres, melodias, harmonias e ritmos do Depeche Mode e do Erasure, mas com uma marca feroz, instrumental e direta.

Curta a playlist completa do álbum SSSS no YouTube

Ouça Elektrostatik, de Plastikman

Ouça o remix de Elektrostatik, por Vince Clarke

O trabalho da dupla mesclou a linha alegre, brilhante e vibrante do Erasure com a síntese de acordes mais sombrios do Depeche Mode. Som vigoroso, que une traços do synthpop, tons melancólicos, pitadas do rock alternativo e rave minimalista no groove minimal europeu.

Track por track

Lowly, a primeira faixa, traz uma linha de síntese com peso e lembra o álbum Sounds of the Universe (2009) do Depeche Mode. Zaat, a segunda faixa, já remete mais aos acordes dos projetos de Clarke. A faixa Spock, terceira do disco, traz um groove marcante, rico em elementos minimalistas e uma pegada sombria.

A quarta faixa, Windup Robot, vai do obscuro para algo mais divertido, como um redemoinho de bips. Bendy Bass, quinta faixa, deixa claro o propósito do trabalho em reviver experiências sonoras anteriores, com ritmo dançante, toque sombrio, quedas e até uma forte referência à track Precious (2005) do Depeche Mode.

Single Blip, sexta-faixa, inicialmente lembra um remix de I Feel Loved (2001), com uma linha de baixo descendente. Skip This Track, sétima faixa, remete a um groove característico dos remixes de faixas do Erasure. Ambas ainda carregam elementos da track Shout (1981).

Aftermaths, oitava faixa, é quase um resumo da ópera... se é que podemos dizer dessa forma. Misturas de lazer, grave potente e kicks bem consistentes, com bastante peso. A track teve seu EP posterior com 5 remixes produzidos por nomes consagrados da cena Techno.

Recycle, nona faixa, reduz ainda mais ao minimal - até mesmo em elementos presentes na track - com uma mescla de bips e arranjo de baixo que abusa dos subwoofers. Flux é a faixa final do trabalho e traz uma composição com síncopes, linhas de síntese marcante e - também - redução de elementos.

O título SSSS vem do som de algumas faixas, que tem uma espécie de ruído branco. Identificava as faixas com esse som no computador como um sibilo, um shhh... Disse a Martin, senti que esse poderia ser o título do álbum inicialmente...Vince Clarke
SSSS é um electroindustrial de grande nível, intrigante e instigante. E apesar de mínimal, Vince e Martin fizeram tudo soar grandioso. Coisa tremenda!

Depeche Mode: a demo mixtape do verão de 1980


Antes de se tornarem um dos grupos mais influentes do mundo, os Depeche Mode eram apenas uma banda de garotos punk new wave chamada Composition of Sound. Vince Clarke e Andy Fletcher, que já formavam o duo No Romance, se juntaram ao guitarrista Martin Lee Gore em 1977. Somente em 1980 recrutaram Dave Gahan para assumir os vocais.

Eles já haviam gravado uma fita demo anterior a chegada de Dave. Mas a segunda fita - que você pode ouvir no vídeo acima - foi crucial para a formação da identidade sonora do Depeche Mode como nós o conhecemos até hoje.

MÚSICAS

O tape contém três faixas: Ice Machine, Radio News e Photographic. Todas compostas por Vince Clarke.

Ice Machine foi gravada em 1981 e lançada somente como b-side do single Dreaming of Me, pela label Mute Records.

Photographic também foi gravada em 1981 e é uma das faixas do álbum Speak & Spell (Mute Records).

Já a track Radio News nunca foi lançada oficialmente, tendo sido tocada apenas uma vez durante a turnê de 1980.

Curtiu? Então, liga o som aí!

Jogo finito x Jogo infinito

Após ler o livro Relógio do Longo Agora, de Stewart Brand, tirei algumas conclusões sobre tudo o que fiz e o que deixei de fazer desde a minha formatura em Comunicação Social no ano de 2003. Esta data, diga-se, representa um marco para minha vida. A partir deste período aconteceram várias situações, decisões, alegrias, tristezas, vitórias, derrotas, investimentos, retornos, despesas e perdas.

Regia minhas ações sob o intuito de fazer algo e ter o retorno em médio ou curto prazo. O tempo encarregou-se de ensinar sobre paciência, perseverança, esperança e realização. O livro de Brand, leitura altamente recomendada em nossos dias, veio de encontro a todas as minhas expectativas. Principalmente no último capítulo, que faz um paralelo entre dois paradigmas interessantes.

Olhamos para nosso cotidiano sob os modelos lançados pelo autor: Jogo Finito versus Jogo Infinito. O primeiro fala a respeito de vencedores e perdedores, competição, sobrevivência e disputas decisivas em curto prazo. O segundo trata de continuidade, de compartilhamento, aprimoramento, consenso, causas e efeitos em longo prazo.

Jogo finito

  • O propósito é vencer
  • O aprimoramento se dá pela sobrevivência dos mais fortes
  • Os vencedores excluem os perdedores
  • Os vencedores ficam com tudo
  • Objetivos são idênticos
  • Simplicidade relativa
  • As regras são estabelecidas de antemão
  • As regras parecem concursos de debates
  • Competir por mercados maduros
  • Disputas de curto prazo decisivas

Jogo Infinito

  • O objetivo é aprimorar o jogo
  • O aprimoramento se dá pela elaboração do jogo
  • Os vencedores ensinam melhores jogadas aos perdedores
  • As vitórias são amplamente compartilhadas
  • Os objetivos são variados
  • Complexidade relativa
  • As regras mudam por consenso
  • As regras parecem com uma gramática de nossas primeiras palavras
  • Criar novos mercados
  • Longo prazo

(apud Mastering the Infinite Game, de Charles Hampden-Turner e Fons Trompenaars, 01997)
A comparação nos leva a pensar sobre a relevância de nossas tarefas. Qual o legado vamos deixar por meio de nossas ações? O que esperar? Qual a expectativa de nossos próximos? Qual a nossa relação com o mundo que nos cerca?

Se você ler o livro de Brand vai perceber tal relação e olhar os problemas da humanidade sob a ótica do tempo e da responsabilidade. Eu explico de forma simples: jogamos lixo na rua e pensamos automaticamente que ele vai sumir, nos esquecemos de como a matéria demora a se decompor e acabamos por poluir o ambiente. Ação de um. Imagine sendo de muitos, em um período longo de tempo?!

O agora, para muitos, representa o hoje, o imediato. Porém, uma ação feita neste agora pode resultar em grandes conquistas do amanhã. Depois de aprender isto, coloquei uma dose de calma em meu coração e esqueci um pouco a pressa - ou a pressão pessoal imediatista. Quero concentrar na tarefa de hoje com o foco no longo agora. Aprimorar, compartilhar, aprender a cada dia algo novo. Fazer o jogo infinito. Pense nisto!

Publicado originalmente em 23/03/2012, por Senoux.